Por Alfredo Soares-Ferreira
Guia do utilizador
Os destinatários deste manual constituem o universo dos leitores. Este manual descreve operações básicas e funções que permitem operações mais convenientes para o pensamento crítico, procedimentos de manutenção da máquina pensadora e, finalmente, a resolução de problemas simples e outros mais complexos que possam ocorrer, no decurso do processo em curso (PEC).
De notar que são necessários conhecimentos técnicos básicos do PEC para permitir que os utilizadores realizem trabalhos de manutenção ou resolução de problemas, nomeadamente no que reporta a eventuais dúvidas, durante a campanha. Em caso de ocorrer algum problema, contacte a sua consciência.
Apresentação do Manual
É muito natural que, a meio do mês de Janeiro, com duas semanas de campanha eleitoral para as Eleições Legislativas, nos interroguemos sobre o verdadeiro sentido do acto eleitoral de 30 de Janeiro. Através da campanha será possível determinar a prestação de cada partido, as propostas que defende, as alianças que será capaz de mobilizar, o tipo de
governança que propõe. Equacionar cenários possíveis, após o acto, é um dos exercícios possíveis, que se pode fazer, mediante a consideração das propostas dos vários partidos, sobretudo daqueles que apresentam um programa. Ainda, no limite, será espectável que cada partido seja capaz de propor soluções concretas para as mais variadas questões que afectam diariamente a vida dos cidadãos.
Está em jogo pois o que é considerado como a prova de vida democrática do País. Muito para além de ser possível especular – e tal acontece de facto – sobre a razão de ser da realização destas eleições antecipadas, o que conta é a centralidade que lhe advém, pelas circunstâncias actuais. Quer na consideração de a pandemia ainda afectar alguns milhares de cidadãos, apesar do sucesso dos programas de vacinação, quer ainda pelo facto de estar iminente a aplicação de fundos europeus a que o País teve acesso e que implicam uma atenção particular, no que reporta à respectiva utilização, bem como à sua escrutinação e fiscalização.
Guia de consulta rápida: para que serve o Acto Eleitoral de 30 de Janeiro
A questão poderá parecer fútil, mas acaba por ter algum significado, devido sobretudo à habitual dramatização, nestas situações. Na realidade, as eleições destinam-se a eleger os 230 deputados da República, que, na Assembleia irão desempenhar a sua função durante a próxima legislatura, um período de 4 anos. E não, como parece ser a intenção deliberada de certos candidatos, a eleger um primeiro-ministro, até porque o desenho do parlamento a eleger pode determinar outros arranjos e combinações, que determinem soluções como a que ocorreu em 2015.
Procedimentos básicos: tempo de antena, um direito ou um privilégio?
A constituição da República consagra, no seu Artigo 37.º, a liberdade de expressão e informação, proclamando no seu item primeiro, “Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.” A concessão da palavra aos candidatos, insere-se no direito, que Habermas defende, quanto à evolução das comunidades democráticas modernas na sua heterogeneidade. Neste particular, considera-se que qualquer processo eleitoral deve respeitar o pluralismo e as peculiaridades existentes na sociedade.
Esta interpretação contém, no plano da comunicação social actual, uma certa perversão. Ainda que possa ser considerada como banal a circunstância de serem as estações televisivas a “determinar” um formato específico, que, para este acto eleitoral, se traduz em sucessivos debates, com a duração de 25 minutos, com a excepção feita ao debate entre os dois líderes que, segundo as televisões, são candidatos a primeiro-ministro, a que foi atribuído o triplo do tempo. Na prática, tal decisão surge, aos olhos da maioria dos cidadãos, como uma oferta ao candidato de um tempo de antena de cerca de 12 minutos, enquanto, após o “debate” se segue um infindável coro de comentários, em que os autores têm mais do dobro ou do triplo do dito tempo de “oferta”.
O certo é que as TVs querem fazer o candidato à sua imagem e semelhança, ou seja, ele deve ter características idênticas às de actores ou apresentadores e todos eles, mais os comentadores, politólogos e demais “influenciadores”, devem servir o deus supremo das audiências, que vale mais (ou menos) que o concorrente directo, quanto mais (ou menos) gritar a sua “razão”, ao ritmo bem estudado de frases curtas, de forte impacto e de amplitude mortífera para o suposto adversário, aqui visto frequentemente como “inimigo”. Para além de mais uma perversão, que leva os ditos “comentadores” a julgarem-se representantes de alguém, em geral e no particular.
Assistência e Manutenção: questões que ficam por debater
Pode dizer-se, com algum grau de acerto, que, pondo de lado as questões da saúde, do SNSe dos seus intervenientes, poucas foram as questões trazidas a debate e que afectam diariamente a vida dos cidadãos. Não se falou de cooperativismo ou associativismo, da realidade de uma economia social que, no caso das cooperativas, contribuiu de forma decisiva para resolver muitos problemas, durante a pandemia. Um dos exemplos porventura mais significativos, foi o número de vezes e o tempo concedido, para falar dos aumentos dos preços dos combustíveis, da energia e consequentemente dos bens essenciais, que, para os cidadãos mais carenciados significam um brutal murro no
estômago. De habitação, pouco se falou, ou de como as grandes cidades são transformadas em dormitórios para turistas e onde vivem pessoas na rua, sem casa e sem abrigo.
Ou da precaridade de emprego, sendo que aqui parece mais importante citar que descemos percentualmente o desemprego, sem (querer) ver o tipo de emprego que é oferecido. Ou da Europa, onde continuamos a ser “periféricos”, um epíteto que significa uma marginalização cada vez maior e de como um sistema monetário nos oprime e nos conduz à estagnação e à emigração. E, a propósito, se poderia falar em mais uma perversão da Democracia, a saber, a substituição da realidade da vida de grande parte dos cidadãos por uma outra realidade, artificial e fabricada. Que afinal, diz muito pouco aos cidadãos.
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