“Je, tu, il, elle”, Akerman

Chantal Akerman (1950–2015) foi uma cineasta belga cuja obra singular transformou profundamente o cinema contemporâneo com uma abordagem radical e intimista, explorou temas como o cotidiano feminino, a memória, a identidade judaica e a solidão, tornando-se referência no cinema feminista, queer e experimental.

Nascida em Bruxelas, Akerman decidiu tornar-se cineasta aos 15 anos, inspirada por “Pierrot le fou”, de Jean-Luc Godard. Aos 18, realizou seu primeiro curta-metragem, “Saute ma ville” (1968), que já revelava sua estética provocadora. Em 1974, com “Je, tu, il, elle”, iniciou uma trajetória marcada por narrativas não convencionais e uma linguagem visual austera, centrada em planos fixos e longos.

Seu filme mais emblemático, “Jeanne Dielman, 23 quai du Commerce, 1080 Bruxelles” (1975), acompanha três dias na vida de uma dona de casa viúva que se prostitui para sustentar o filho. Com duração de 3h20, o filme retrata com minúcia a rotina doméstica, revelando a opressão do trabalho invisível das mulheres.  Em 2022, foi eleito o melhor filme da história pela revista britânica “Sight and Sound”, sendo a primeira vez que uma obra dirigida por uma mulher liderou essa lista.

Equipa de Akerman (a penúltima, da esq. para a dir.) – Foto: Virginia-Haggard-Leirens. Imagens: Fundação Chantal Akerman.

Akerman explorou frequentemente a memória e a herança do Holocausto, influenciada pela experiência de sua mãe, sobrevivente de Auschwitz. Em “News from Home” (1976), combinou imagens de Nova York com cartas da mãe, criando um retrato da distância e do afeto. “D’Est” (1993) documenta a transição pós-soviética na Europa Oriental, enquanto “No Home Movie” (2015), seu último filme, é um diálogo íntimo com a mãe, gravado pouco antes de sua morte.

Sua estética é marcada por planos longos, ausência de trilha sonora convencional e uma observação paciente do cotidiano, desafiando as normas narrativas tradicionais.

Após sua morte em 2015, Akerman tem sido amplamente celebrada. Exposições e retrospectivas, como a realizada no Museu de Arte Contemporânea de Lisboa em 2025, destacam sua influência duradoura. Sua obra continua a inspirar cineastas contemporâneos, como Isabel Coixet e Carla Simón, que reconhecem sua abordagem inovadora e sensível à vida cotidiana.

Chantal Akerman permanece como uma das vozes mais influentes e originais do cinema mundial, cuja obra continua a provocar reflexões sobre gênero, identidade e a arte de filmar o cotidiano. 

About the Author

Raquel Azevedo
* Raquel Azevedo é técnica multimédia, produtora, activista sindical e cinéfila.

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