Por Raquel Azevedo *
A vitória de Mandani em Nova Iorque representa mais do que uma mera conquista eleitoral — é um gesto de resistência política, um grito de esperança e um símbolo de transformação possível em tempos sombrios. Num cenário de polarização, crises sociais e descrença nas instituições democráticas, Mandani (nome completo: Mandani) emergiu como a prova viva de que a política ainda pode ser feita com empatia, coragem e compromisso com as comunidades esquecidas. Esta vitória ecoa atravessando fronteiras e refletindo-se na história de lutas semelhantes.

Cinematograficamente, a sua significância encontra espelho no filme “Selma” (2014), de Ava DuVernay. Assim como Martin Luther King liderou uma marcha pela dignidade e pelo direito de voto em 1965, Mandani lidera agora milhares de vozes silenciadas, trazendo para o centro do poder aqueles que durante décadas foram empurrados para as margens — migrantes, afrodescendentes, latinos, asiáticos, trabalhadores precarizados, mulheres e jovens sem futuro garantido. A comparação com “Selma” não é apenas simbólica, mas profundamente política. Ambas as histórias nascem do sofrimento coletivo perante sistemas violentos e desiguais. Ambas são construídas a partir da organização comunitária e da crença numa justiça que ainda não existe. E, sobretudo, ambas desafiam a estrutura do poder, questionando quem tem direito a governar e quem tem direito a ser ouvido. No entanto, o caminho que se abre não é fácil. Mandani herda uma cidade marcada pela crise habitacional, desigualdade extrema, racismo estrutural e desinformação.

Tal como King enfrentou a brutalidade policial e o bloqueio institucional, Mandani enfrenta agora um sistema político hostil, corporações que lucram com a desigualdade e uma oposição disposta a deslegitimar cada passo dado. Mas se “Selma” nos ensinou algo, foi que a esperança não é passiva: é ação. A marcha só fez sentido porque se transformou em lei — o Voting Rights Act de 1965. Da mesma forma, esta vitória só terá valor se resultar em políticas concretas: habitação acessível, justiça climática, reforma policial, inclusão social e dignidade para quem constrói a cidade, mas raramente tem lugar nela.
Nova Iorque enviou ao mundo uma mensagem clara: a democracia não está morta. Pode estar ferida, capturada pelos interesses económicos, contaminada por discursos de ódio — mas ainda respira. E enquanto houver líderes como Mandani e povos dispostos a marchar, votar, resistir e sonhar, haverá sempre uma porta entreaberta para a esperança. Hoje, essa porta tem nome e rosto. E começa em Nova Iorque — mas pertence a todos nós.

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