Argentina. Duas atitudes opostas: cooperação pela soberania ou devastação neoliberal

“O movimento cooperativista argentino não pode permanecer indiferente. Este antagonismo desafia a sua própria razão de ser. É hora de escolher: acompanhar passivamente o declínio ou assumir ativamente a defesa da entidade cooperativa, camponesa e territorial?”

A política, quando é verdadeira, não se reduz a discursos ou ajustes orçamentários. A política é, em sua essência, uma forma de decidir quem é cuidado, quem é respeitado e quem é empoderado. Dessa perspectiva ética e cooperativa, dois eventos recentes — um no Brasil e na Venezuela e o outro na Argentina — expõem de forma contundente duas atitudes antagônicas em relação aos camponeses, à terra e à soberania alimentar.

  1. Milei e Argentina: o desmantelamento como ideologia

    No extremo oposto, o governo de Javier Milei, na Argentina, eliminou o Instituto Nacional de Agricultura Familiar, Camponesa e Indígena, deixando 900 trabalhadores com décadas de serviço nas ruas. Esta não é uma medida isolada: faz parte de uma estratégia consciente de devastação institucional e territorial.

    Ao suprimir o apoio técnico e humano às famílias camponesas, aos povos indígenas e às cooperativas, o governo não só destrói políticas públicas como também rompe laços, sufoca processos comunitários, elimina canais de organização e enfraquece a democracia territorial.

    A atitude de Milei não é meramente administrativa ou fiscal. É ideológica. Baseia-se na crença de que o mercado é o único ator legítimo e que qualquer coisa que cheire a organização de base, conhecimento coletivo ou justiça social deve ser erradicada como anomalia. Para essa visão, o campesinato é supérfluo e as cooperativas são “ninhos de lixo”.

No primeiro caso (MST-Venezuela), o povo organizado é reconhecido como sujeito político e produtor de soberania.
Na segunda (Argentina-Milei), a população rural é tratada como um fardo a ser eliminado.
Uma abre caminhos para a cooperação regional e o planejamento agroecológico; a outra desertifica o território em nome do ajuste, com uma visão profundamente autoritária e antinacional.

O que está em jogo não é apenas o destino de milhares de famílias, mas o tipo de sociedade que queremos construir: uma enraizada na cooperação, na comunidade e na solidariedade, ou uma de desapropriação, individualismo extremo e subordinação a poderes econômicos concentrados.

O movimento cooperativista argentino não pode ficar indiferente. Esse antagonismo desafia sua própria razão de ser. É hora de escolher: acompanhar passivamente o declínio ou assumir ativamente a defesa da entidade cooperativa, camponesa e territorial?

Como cooperador, afirmo: soberania não é compatível com ultraliberalismo. Democracia não se sustenta com demissões em massa ou expulsão de camponeses. A cooperação — quando autêntica — se posiciona, resiste, cria e sonha junto com o povo. Como o MST faz. Como nossa história fez. Como devemos fazer hoje.

Em fraternidade, um abraço cooperativo!

About the Author

Jose Yorg
José Yorg é educador e docente técnico em Cooperativismo, membro da Rede de Investigadores Latinoamericanos de Economia Social e Solidária (RILESS), que envolve universidades da Argentina, Brasil, Equador e México. Este argentino nascido em Assunción (Paraguay) desenvolve actividades na Tecnicoop, na província de Formosa, onde é também perito judicial técnico em Cooperativismo no Superior Tribunal de Justiça.

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