O Cooperativismo estará preparado para a Revolução Industrial 4.0?

Marcelo de Andrade*

Por Revolução Industrial 4.0, antes do mais, entenda-se a Automação (acessível) e a Inteligência Artificial. Sim, o mundo cooperativo tem que ponderar, opinar, fazer estudos e prognósticos para um futuro que é já presente.

Para os investigadores em Tecnologia de Informação, a primeira revolução industrial foi impulsionada pelo vapor, a segunda pela eletricidade e a terceira pela microelectrónica. A próxima está a ser delineada pela automação, robótica e inteligência artificial. Assim tem sido designada a “Indústria 4.0”.

Para um cooperativista, não se aplica o medo primordial: é desta que as máquinas vão nos tomar de vez os empregos? É desnecessário recordar que quem pensa “coop”, pensa primeiro no valor das pessoas dentro de um empreendimento, mesmo que por meios comerciais, tão caros dos defensores do Capital.

O que podemos (devemos?) questionar é como estas ferramentas podem ser úteis ao nosso trabalho. Não é a optimização do trabalho. É a optimização do homem quando trabalha, mas também quando não consegue trabalhar, sobretudo para o lucro de quem apenas o explora. Ainda é um Estado Social. É o Social da Economia.

Steven Dhondt desenvolveu um estudo da União Europeia sobre o trabalho e a mudança organizacional pela Universidade Católica de Leuven, na Bélgica. A investigação abordou o impacto da tecnologia no emprego durante as últimas quatro décadas. A conclusão é inesperadamente optimista.

“Não deveríamos ver a tecnologia como uma ameaça – deveríamos antes utilizá-la para moldar o futuro e criar novos empregos”

Steven Dhondt, investigador da Beyond4.0

Os investigadores do think tank Beyond 4.0 estudaram empresas europeias que tomaram medidas proactivas para capacitar seus funcionários, em resposta aos dados de um estudo sobre o trabalho e a formação na UE, que aponta que mais de 70% dos cidadãos europeus receiam que as novas tecnologias “roubem” os seus empregos.

Um dos estudos de caso foi uma empresa de design de produtos em vidro, a holandesa Metaglas, que decidiu oferecer aos trabalhadores uma voz mais activa destes no desenvolvimento de produtos pela direção da empresa. Para além de uma maior abertura na sua gestão. Enfim, fizeram o sentido inverso da lógica cooperativa, para reter os trabalhadores e a reinvestir o lucro na formação e força de trabalho. Mesmo com a maior automação.

Para Dhondt, os empregos estão em risco se os gestores investirem apenas nas máquinas: “Se a gestão utilizar a tecnologia para melhorar os empregos, os trabalhadores e as organizações poderão aprender e melhorar”, em reportagem para a revista Horizon por Andrew Dunne. E conclui que “a tecnologia pode ser potenciadora, em vez de uma ameaça, mas a decisão sobre essa matéria cabe à gestão das organizações”.

No Brasil, a Integrada Cooperativa Agroindustrial foi recentemente distinguida com um prêmio de inovação após investimentos em transformação digital com recurso a Inteligência Artificial. A sólida coop do agronegócio conquistou um prémio de Inovação da gigante Oracle para a América Latina, com o projeto de Inteligência Artificial “Iris”, destinado a otimizar o atendimento aos cooperados e clientes online de animais de companhia, em sua vertente de rações animal.

Linha industrial da Integrada Coop

Esta ferramenta de chat da loja online identifica a raça do animal, através da introdução de informações e foto, e recomenda o alimento ideal, levando em conta as características específicas do “pet” e a composição nutricional do alimento. A plataforma também calcula e sugere a quantidade diária ideal de alimento.

No entanto, é um exemplo de utilização de uma “ferramenta 4.0”, sem implicações directas na gestão da já bastante informatizada cooperativa paranaense, mais conhecida por suas soluções industriais em insumos, processamento de milho e distribuição das produções agrícolas. É a optimização dos trabalhadores.

Embora já seja algo comum a incorporação de ferramentas com recurso a Inteligência Artificial nos produtos e serviços cooperativos em Portugal e um pouco por todo o mundo, sobretudo por meio de aplicativos para smartphones, o impacto deste admirável mundo novo ainda é pouco estudado ao nível da gestão cooperativa.

Valorizar “o trabalhador” e o apelo à Responsabilidade Social são dos mais desgastados bordões do marketing para atribuir credibilidade a uma empresa comercial, como se não fossem as iniciativas da Economia Social a fazê-lo por sua própria natureza.

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Marcelo de Andrade
Editor do Diário 560. Jornalista e Fotojornalista há 35 anos.