
Vanda Azuaga *
Eu raramente viajei só. Não gosto, sinto-me desacompanhada e insegura. Se meter viagens de avião ainda é pior, os aeroportos intimidam-me sobremaneira. Já não me sinto capaz de lidar com tantos ecrãs informativos, tantos placards, tanta tecnologia. Tenho sempre medo de que o telemóvel fique se bateria na hora H, que a net falhe e não possa apresentar o bilhete eletrónico (por isso faço capturas de ecrã, sim pelo menos duas, just in case…), tenho pânico de fazer disparar algum alarme de segurança, que me peçam para ser revistada e que, entretanto, alguém me roube os pertences que fui obrigada a deixar ali, expostos, num tabuleiro que desliza à vista de todos e ao alcance de qualquer um. Eu sei que faço filmes, eu sei. Mas infelizmente devo ter ar de traficante ou malfeitora e o sistema de revista, que tanto quanto sei é aleatório (de x em x pessoas, mandam revistar), deve ter um fraquinho por mim! Sem falar dos suores que me assolam quando as portinholas não abrem e eu insisto em meter o passaporte para ser lido em todas as posições possíveis, sob o olhar condescendente dos passageiros acostumados e desenvoltos que deslizam pelos espaços do aeroporto com ar de quem está em casa e apenas passa da cozinha para a sala.

Já conheci muita gente que ama viajar só e que me assegura que é do melhor. Tenho até um amigo viajante que conheci, por acaso, num grupo de internet, quando estava em Maputo, que me disse “se eu não viajasse sozinho, nunca nos teríamos conhecido”. Bem verdade. Vi num grupo que ele era novo na cidade, procurava alguém que lhe mostrasse o que de melhor havia por ali, e eu achei que era uma boa ideia responder-lhe. Saímos umas poucas vezes, conversámos muito, visitámos vários locais juntos, partilhámos experiências e comidas e bebidas, fomos ouvir música tradicional e separámos-nos com a promessa que um dia ele viria ao Porto ou eu a Estocolmo. Ainda não se deu outro encontro presencial, mas continuamos a saber das nossas vidas via FB.
Vem esta conversa a propósito do que aconteceu há pouco. Estava com uma amiga a jantar no Plateau, na zona nobre da cidade da Praia. deliciávamo-nos com uma bela mandioca frita com linguiça, seguida de um caldo de peixe com leite de coco. Ao nosso lado sentou-se uma mulher, já não muito jovem. Pousou a mochila que trazia na cadeira e falou à-vontade com a empregada, parecendo cliente habitual. De repente, um gatito esquálido desatou a miar aos meus pés e só se calou quando lhe dei um pouquinho do meu peixe. Ali, ela começou a conversar, o gatito esfomeado foi o pretexto. Viajava só, estava por cá por causa de um projeto relacionado com a agricultura e com economia social. Hum, pareceu-me interessante e começámos a trocar impressões, ainda de forma um pouco formal. A dada altura ela disse que era do Porto e aí, carago, a conversa fluiu de outra maneira! Até o sotaque se acentuou! Enquanto ela comia uns belos de uns pasteis de milho – acompanhados de uma Krioula – e nós já dividíamos a sobremesa – queijo di terra com doce de papaia – fomos trocando ideias, opiniões e números de telemóvel. Fizemos projetos que incluem o próximo fim de semana!
Regressada a casa, sinto que “estive de férias” algumas horas no Plateau. Fui viajante, sem sair da cidade. Soube-me tão bem quebrar a rotina casa-trabalho. E pensei: se aquela mulher estivesse acompanhada, não ia meter conversa com as clientes do lado ou mais dificilmente o faria. Viajar só, tem destas coisas, não temos nada a perder em “meter paleio”, como se diz na minha terra.
Ainda bem. Conheci mais uma pessoa interessante.
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