Paulo Jorge Teixeira *
Tinha quase oito anos no dia 25 de Abril. Não tinha família fascista, ou comunista, ou com qualquer ligação a nada a não ser a minha ligação afetiva ao Benfica, e a gostar de Trás-os-Montes, a minha Rosebud na Vilariça. Recordo a data, porque a junto a uma situação especial, depois da morte do senhor meu Pai, foi a primeira vez que se ligou a televisão na nossa casa no Carvalhido. Numa altura em que no prédio, só na nossa casa havia TV, foi para os miúdos que éramos, eu e os meus irmãos algo de entusiasmante e diferente. Não havia medos, mágoas, ou sentimento de perda. Achavam todos que isto ia mudar. E nisso tinham razão, mudou mesmo.
Faço aqui desta nota, que o texto que escrevo se reporta a construção que me fiz de me encontrar pelos livros, e pelo exemplo da senhora minha Mãe para ser o homem que sou hoje. Completamente livre e completamente solto, e aqui invoco a amizade ao Zé Ribeiro e Castro por usurpar este dito que ele e bem o disse num dia feliz. A busca que me fiz como ser humano desde tenra idade, sei-o hoje, só foi possível porque a fiz em completa liberdade. E esta foi-me dada por Abril. Pelo dia em que o regime caiu de podre e em que aparentemente ninguém o quis defender.
Nós que nos afirmamos de Direita, não devemos nunca buscar mágoas que não são nossas, e devemos sim, lutar todos os dias por manter vivas as heranças e as raízes que nos foram legadas. E muitas vezes esquecemo-nos disso. E por isso chegamos ao ponto em que estamos. Como diria o Cardeal Alpedrinha se a memória não me atraiçoa estamos a precisar de uma grande reforma. De agentes novos, de substituição de gerações e mentalidades, de repensar bandeiras e de formar. Ensinar formar e agir. Como nos idos quinhentos, em pequenos grupos, forças especiais como se diz hoje. Precisamos não de carpir mágoas, e repisar o que todos sabemos, mas precisamos de seguir em frente.
Sim, o que se passou depois de Maio foi terrível, e ainda hoje pagamos um preço tão forte que nem o queremos ver. Sim, o que fizemos nos territórios ultramarinos foi imperdoável, causando milhões de mortes após a maneira covarde como saímos de lá. Sim, em Novembro aceitamos em troca de nada perder a guerra cultural, que nos traz aos dias de hoje. Sim, hoje a Igreja que nos fez como entidade independente, não passa de uma simpática agremiação cultural (com pena o digo e escrevo) que nada acrescenta, enredada que está num ecumenismo destruidor da entidade que nós fomos construindo. Tudo isso é verdade, mas como diziam os Druidas o veneno é um lago estéril onde nada cresce.
E nós a Direita, deixamo-nos colocar nesses territórios de fronteira, perto de tudo e do nada, sem eira nem beira, como diz o Povo. Por isso acho um dever de Cidadania, defender o bom e o valor último, o sempre livre de utopias, que a usam para maus caminhos, e a fazem perder o norte, defender sim e sempre, e todos os dias, a Liberdade. Só este é o valor que todos une. Só este é o valor que soma acrescente, capta o vento, a luz, e faz chover para regenerar a terra. Só buscando Agostinho, conjurando Quadros, apelando a Pessoa, podemos seguir.
Falar de Abril é seguir em frente, é entender que urge retomar os deveres que temos antes de termos direitos, para com os outros e para com a nossa comunidade.
Basta de combater em constante retirada, fazendo do Povo, quando nos interessa, o que deve sair da bruma e salvar esta comunidade que hoje se chama Portugal. Nós temos a responsabilidade de refazer o futuro porque nele fazemos parte e sentido.
Hoje, isto chama-se Portugal, mas nas serras da lua aos contrafortes das serranias que abundam, foi sempre capaz, de sem meios e sem nada mais que a vontade, fazer ser algo que o destino não queria fazer cumprir. Por isso falar de Abril é seguir em frente, é entender que urge retomar os deveres que temos antes de termos direitos, para com os outros e para com a nossa comunidade. Este ano em que se comemoram os 500 anos do nascimento de Camões, devemos ver a oportunidade de ter um exemplo de um Homem que sonhou, que amou gente de todas as cores e estratos, que foi tudo, e que nos deixou tudo, que moldou o que recebeu das viagens, dos conhecimentos de outros povos e gentes (tal como hoje) para mostrar a singularidade de ser Português.
Ousar porque não podemos voltar para trás. Fazer porque somos e queremos ser livres. Sonhar porque somos a ponte entre o mundo, e os mundos que existiram e existem. Porque queremos ser Portugueses, Abril, este ano dá-nos a oportunidade de retomar caminhos e fazer por ser a terra do Espírito Santo. De uma vez por todas. Por isso como diz o povo, o Tomate (a liberdade) até faz o serrim (o que se passou que não gostamos) saber bem.
* Paulo Jorge Teixeira, para o efeito deste artigo, se define como “Cooperativista e Agitador Cultural. Presidente da Cooperativa do Povo Portuense. Deputado na Assembleia Municipal do Porto.”, e ainda “Corresponsável do projeto «O Farol», dos seus «Copos à Direita» e do livro «Abril pelas Direitas… foi bonita a festa, pá?»”, coordenado por Rodrigo Pereira Coutinho e pelo próprio autor.
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