A Comuna

“Interessa-me o futuro
porque é o lugar onde vou passar o resto da minha vida”
Woody Allen

Por Alfredo Soares-Ferreira

Em Abril de 2017, um grupo de cidadãos residentes no Norte do País, procurou juntar esforços no sentido de formar uma Cooperativa destinada a construir uma aldeia comunitária, a que chamariam A Comuna. O projecto visava, à época, proporcionar aos futuros cooperadores um tipo diferente de vivência, um espaço comum de experiências e alguma qualidade de vida, baseada no apoio comunitário. Após algumas tentativas falhadas, por dificuldades várias, o projecto acabou por não se concretizar. Ficou, sem qualquer dúvida, a ideia, o conceito.

Porquê viver em comunidade
Há quem as designe, com forma e geometria varáveis, de aldeias comunitárias, eco-aldeias ou comunas, são na realidade, comunidades urbanas ou rurais de cidadãos, cuja intenção primeira é a de integrar uma vida social harmónica a um estilo de vida sustentável. Uma característica comum parece ser a de juntar cidadãos de vários grupos etários, muito embora, em alguns casos, seja muito comum uma maioria de cidadãos séniores.

A proposta, de cariz essencialmente democrático, apela à defesa de uma economia de base local, para a produção dirigida à comunidade, quer na vertente da agricultura localizada, quer no sector da prestação de pequenos serviços de apoio, orientados para as pessoas, para a saúde e o bem-estar. É ainda o conceito de cuidado, apoiado na perspectiva inter-geracional, que, para além de todas as vantagens inerentes ao apoio das e às pessoas, tem uma valorização imensa, no que reporta à difusão e multiplicação de conhecimento e de saberes.

Os defensores da ideia sustentam que estes espaços devem funcionar de maneira democrática, com decisões tomadas por consenso. Por essa razão, defendem também que o modelo organizacional deve ser o de cooperativa simples, um cidadão, um voto. Uma das premissas fundamentais é a de que cada pessoa, ou família, vive num espaço privado, a sua casa, e partilha os espaços comunitários, localizados em um, ou vários edifícios, conforme a sua especificação concreta, seja a horta comunitária para prover as necessidades alimentares diárias, seja a oficina ou atelier, para praticar e fruir do conhecimento prático e social. Serão assim, espaços colectivos de vida e de intervenção cívica. No espaço próprio e no comunitário, deverá cultivar-se o modelo cooperativo e solidário, espírito de entreajuda e de mútua cooperação.

Permacultura, o que é?
O termo permacultura, que deriva do inglês “Permanent Agriculture”, também por vezes designado por “agricultura permanente”, surgiu nos anos 70 do século passado e foi sucessivamente relacionado com um conjunto alargado de saberes, provenientes de diversas áreas científicas, passando a ser entendido como “Cultura Permanente”.

Modernamente a permacultura é considerada uma ciência de âmbito social e ambiental que alia o conhecimento científico com o conhecimento tradicional e popular. Como utiliza, na sua essência, padrões e características observados em ecossistemas naturais e uma posição crítica relativamente ao uso dos combustíveis fósseis, é normalmente associada à tipologia de comunidades que referimos, tornando-se para algumas num paradigma fundamental, pelo menos no que reporta ao sistema de planeamento desses ambientes e na sua prática social e comunitária.

Uma experiência no nosso País: a comunidade Tamera
É em Odemira e declara-se contra a violência e pelo amor livre, um paraíso hippie situado no Monte do Cerro. A comunidade Tamera, iniciada por três alemães e instalada em 1995, agrega hoje 200 residentes, 170 adultos e 30 crianças. Vivem em comunidade e organizam eventos, de que se pode destacar o realizado em 2019, “Defender o sagrado: conferência para agentes de mudança globais”. É segundo afirmam, “…um regresso às origens, em harmonia com a natureza e sem violência” e propõem-se criar uma rede global para um futuro sem guerra.

Uma aldeia comunitária em extinção
No Parque Natural de Montesinho, em Bragança, a aldeia de Rio de Onor é considerada como uma das últimas em Portugal onde ainda se praticam hábitos comunitários. A pequena freguesia está dividida a meio pela fronteira com Espanha. Deste lado, é Rihonor de Castilla, mas na verdade os habitantes das duas aldeias sentem que são um único povo, que inclusivamente possui um “governo” e uma língua própria, o rionorês. Costumam chamar-se, o “povo de cima” e cá o “povo de baixo”.

Rio de Onor é uma aldeia comunitária, o que significa que os habitantes partilham algumas coisas e se entreajudam. Partilham, por exemplo, o forno comunitário e terrenos agrícolas onde todos trabalham e um rebanho que pasta nestes terrenos. O que acontece é que, nos dias que correm, já só restam 50, dos 398 habitantes que existiam em 1950 e têm hoje uma média de idades acima dos 70 anos.

Um exemplo operatório possível
O projecto inicial previa a aquisição de um terreno na zona do Grande Porto, cidade ou arredores, de preferência perto de rio ou mar e com alguns requisitos importantes, como por exemplo, a área disponível para as edificações diversas, e a proximidade de meios de transporte, metro, comboio ou autocarro.

A definição das áreas interior e exterior seria sempre em função do número de interessados. Os espaços colectivos consistiriam numa sala de convívio, cozinha e forno comunitário, biblioteca, pequeno auditório, atelier de pequenos ofícios, ginásio, balneário e piscina, garagem e armazém comunitário. Os espaços individuais ou familiares, a definir para casa situação, consistiriam numa pequena habitação, que deveria incluir, nomeadamente quartos, sala, casas de banho e uma pequena cozinha.

Os princípios básicos a ter em linha de conta, passavam pela eficiência energética, a eficiência hídrica e a economia circular nos edifícios. Os sistemas de climatização e produção de água quente sanitária seriam baseados em fontes de energia renováveis. Os espaços, colectivo e individuais, deveriam ter autonomia energética completa, supondo alimentação por energia solar, térmica e fotovoltaica, sendo a primeira para aquecimento e arrefecimento, de águas e ambiente e a segunda para fornecimento de energia eléctrica.

Os espaços exteriores deveriam conter horta, quintal, pomar e jardim. Todo o projecto englobaria o desenvolvimento actividades facultativas, de animação cultural, recreativa e desportiva, com especial ênfase, na leitura, teatro, música, com palestras, workshops, exposições e tertúlias.

Um desafio?
Porque o mundo se move, existe sempre a possibilidade de, um dia, se poder concretizar o projecto. Na exacta medida em que as condições actuais podem ser mais favoráveis, quer pelo aprofundamento da ideia inicial, quer ainda porque o pequeno círculo inicial possa ser alargado, o certo é que existirá agora uma possibilidade real, que urge aproveitar. Porque gostamos dos sonhos do futuro, este poderá ser um estimulante projecto que nos mobilizará.

Basta então, e por agora, ficar atento.

About the Author

Alfredo Soares-Ferreira
Engenheiro e Professor aposentado. Consultor e Perito-Avaliador de Projectos nacionais e internacionais para o Desenvolvimento e Cooperação.

1 Comment on "A Comuna"

  1. Celeste Guido❤️ | Fevereiro 27, 2022 at 11:11 am | Responder

    A very good idea. We need peace, we need love and not war.
    Earth needs respect and humans don’t do it.
    I’s the first time I comentou.

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