Argentina: Cooperativa de habitação recupera fábrica abandonada e negoceia com novo proprietário

Reportagem da Agência de Notícias Solidárias (Ansol) da Argentina acompanha a Cooperativa Habitacional Papa Francisco, que luta pela manutenção de uma fábrica abandonada para fins habitacionais de 107 famílias há mais de 20 anos.

A Cooperativa Habitacional Papa Francisco conquistou no início deste mês um acordo que suspendeu por seis meses o despejo da Casa Santa Cruz, prédio do bairro Parque Patrícios, onde vivem 350 pessoas. A partir de 31 de Outubro, e durante 180 dias, haverá um grupo de trabalho para encontrar uma solução definitiva para o conflito.

O espaço onde funcionou uma fábrica têxtil, que faliu na década de 90, foi ocupada por vizinhos entre 2002 e 2004, que o batizou de Casa Santa Cruz (já que se localiza no n.º 140 naquela rua). Em 2010 o prédio foi leiloado e em hasta pública e o novo proprietário o adquiriu com as pessoas lá dentro, dando início a um processo de despejo. Os moradores e vizinhos conseguiram se organizar como empresa recuperada Cooperativa Habitacional Papa Francisco.

A reportagem da Ansol teve acesso aos detalhes desse acordo, pelo qual foi interrompido o despejo ordenado na 60.ª Vara Cível da cidade de Buenos Aires. Iliana Llanos, presidente da Cooperativa Habitacional Papa Francisco, explicou que o documento que dá trégua às famílias tem as assinaturas do Governo da Cidade de Buenos Aires (GCBA), dos vizinhos, do propriétário, Leonardo Ratuschny e os representantes judiciais.

Solução à vista por via cooperativa

“É uma suspensão por 180 dias, com a criação de uma comissão para chegar a uma solução definitiva e cabendo ao GCBA uma taxa de arrendamento ao proprietário por este período”, explicou Llanos, que disse que “o acordo é bom”, apesar de o ter assinado com a polícia à porta do prédio e sob pressão de despejo.

Manifestações pela Coop Papa Francisco.

A possível dívida do Governo de Buenos Aires em pagamento ao proprietário não pode ser motivo para avançar com um novo despejo. Em 2019 houve uma tentativa de despejo, e após uma ação de proteção um tribunal proibiu que as famílias fossem levadas para hotéis e determinou que o governo de Buenos Aires deveria garantir um benefício econômico para que as famílias o pudessem arrendar.

Recorde-se que em 25 de Outubro os moradores realizaram uma manifestação no Obelisco de Buenos Aires, para pressionar o poder público contra a ordem de despejo marcada para o dia 31.

“Há 13 anos que se pedem soluções e não há respostas, o mercado imobiliário não tem ofertas e somos famílias com poucos recursos, não somos classe média e contentámo-nos com esta cooperativa habitacional para aceder ao crédito da Lei individual nº 341, mas que até então nos era negada”, esclarece Llanos à Ansol.

Empresas Recuperadas por via cooperativa

Na Argentina existem mais de 400 empresas recuperadas em todas as áreas da Economia. O programa Empresas Recuperadas assim designa uma empresa sob gestão dos seus trabalhadores, constituída em regime de cooperativa de trabalho e proveniente de empresa anterior que, por falência, esvaziamento, abandono patronal ou outras causas, tenha levado ao seu encerramento.

O programa é da responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento (Resolução 1335/21), e acompanhado pelo Instituto Nacional de Associativismo e Economia Social (INAES), é tem se afirmado como uma expressão da Economia Social, Solidária e Popular e sujeita a benefícios fiscais e subsídios.

A experiência existe há mais de 25 anos, onde os trabalhadores se organizam em auto-gestão, sob a figura jurídica cooperativa e os princípios que a norteiam como tal, de forma a proteger e valorizar a sua projeção como empresas sociais, não-lucrativo e com compromisso com a comunidade. (Fonte: Ansol e INAES)

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